
Dia Internacional do Enfermeiro: IPS debate “o poder económico dos cuidados”
O Politécnico de Setúbal, através da sua Escola Superior de Saúde (ESS/IPS), assinalou hoje o Dia Internacional do Enfermeiro, que se celebra este domingo, 12, com um seminário em que se refletiu sobre o valor económico destes cuidados de saúde, em alinhamento com o tema adotado em 2024 pela International Council of Nurses (ICN), que representa milhões de enfermeiros em todo o mundo. “Nossos enfermeiros, nosso futuro: o poder económico dos cuidados” foi o tema que reuniu, ao longo da manhã, docentes, dirigentes e estudantes da ESS/IPS, para pensar em conjunto o impacto, direto e indireto, da intervenção destes profissionais de saúde nas economias mundiais.
De que falamos quando falamos do valor dos cuidados de enfermagem em termos económicos?
Quando falamos do valor económico dos cuidados de enfermagem, estamos, por exemplo, a dizer que dotações seguras em termos de profissionais de enfermagem diminuem os gastos com a hospitalização e diminuem os dias de internamento, e que a ação dos enfermeiros pode evitar deslocações inúteis ao hospital, diminuir a pobreza associada às questões de saúde/doença.
De forma geral sabemos que investir nos cuidados de saúde permite poupar, visto que uma população com saúde pode aumentar o PIB mundial em cerca de 8% (Cipriano, 2024). A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que a cobertura universal em termos de Cuidados de Saúde Primários, onde a ação do enfermeiro é primordial, contribuiria para aumentar a esperança de vida em 3,7 anos de 2023 a 2030 (OMS, 2023) e que a insuficiente prestação de cuidados pode custar à economia mundial cerca de 15% do PIB por perdas de produtividade, tal como o investimento em cuidados de enfermagem de qualidade pode aumentar o rendimento económico de famílias e países (ICN, 2024).
Em que dimensões da sociedade é possível sentir o impacto da profissão de enfermeiro?
Nas várias dimensões sociais, ao longo de todo o ciclo de vida das pessoas. Na promoção da saúde, na prevenção e acompanhamento na doença e também na promoção de uma boa morte. Isto desde a constituição da família, na preparação para a gravidez e parto, ao acompanhamento/aconselhamento para o desenvolvimento saudável das crianças, com a vigilância de saúde, na vacinação e na saúde escolar. Depois, nos cuidados preventivos e acompanhamento dos adolescentes e jovens, nomeadamente no planeamento familiar, na prevenção de consumos e seu tratamento. Na idade adulta, com o trabalho dos enfermeiros no acompanhamento das pessoas com doença crónica, aguda ou em situação terminal, na saúde ocupacional, nos cuidados paliativos, no apoio aos cuidadores, nas situações de crise/urgência e apoio humanitário.
Ou seja, há aqui um papel fundamental na melhoria dos indicadores de saúde do global população, com evidentes ganhos para as economias…
Sim, a intervenção dos enfermeiros tem também impacto nas áreas do planeamento em saúde, na gestão e na investigação. Este trabalho é realizado nas instâncias de governação do sistema de saúde, nas instituições de saúde, nas empresas, em instituições particulares de solidariedade social, em organizações não governamentais, em escolas, em universidades, nas autarquias, em casa das pessoas, em organizações de voluntariado, em corporações de bombeiros ou outras associações. Claramente os enfermeiros estão com as pessoas onde elas precisam do seu apoio. Diremos que em todas as dimensões sociais se sente a relevância dos cuidados dos enfermeiros, quer pelos efeitos diretos quer indiretos, o que inclui a melhoria dos indicadores de saúde da população, o aumento de bem-estar nas famílias e das comunidades de quem cuidam, o aumento da literacia e acesso aos cuidados, diminuição dos dias de hospitalização e maior equidade, favorecendo maior coesão social e crescimento económico das comunidades.
“Portugal subaproveita os enfermeiros e as suas competências”

A este nível, a realidade portuguesa acompanha o que se passa à escala internacional, nomeadamente europeia?
Os enfermeiros portugueses estão muito bem cotados a nível internacional pela qualidade da sua formação e do seu desempenho. No entanto, verifica-se que, ao contrário da maioria dos países europeus, Portugal regista uma média de enfermeiros por mil habitantes abaixo da média europeia – 8,1 em Portugal para 8,8 na União Europeia (OE, 2023) – e não permite aos enfermeiros o desempenho cabal das competências que detêm. Diremos que Portugal subaproveita os enfermeiros e as suas competências, sendo recorrente a sua subvalorização, até no campo das decisões em matéria da gestão em saúde. Temos enfermeiros com especialização, que pagam do seu bolso mestrados e doutoramentos, e que não conseguem exercer as suas competências nos serviços onde trabalham.
Isso explica a debandada de enfermeiros portugueses, ao longo dos últimos anos, para outros países europeus?
Sim, talvez seja essa uma das razões que levam os enfermeiros a emigrar para outros países da Europa. É como se em Portugal os saberes destes profissionais devessem ser escondidos ou apagados, o que dificulta o acesso aos cuidados de saúde, tornando-os menos equitativos e aumentando a despesa com os cuidados de saúde. A OCDE (2019) refere que, num estudo realizado em países que pertencem à organização, cerca de 79% dos enfermeiros se dizem subaproveitados face às competências que detêm. Trata-se de um desperdício efetivo do capital humano das organizações de saúde.
Enquanto enfermeira e professora de futuros enfermeiros, que principal mensagem lhe parece importante destacar nesta efeméride?
Neste Dia Internacional do Enfermeiro destaco a necessidade de continuarmos a trabalhar em prol do desenvolvimento da profissão, pela formação de enfermeiros que sejam reflexivos, que exerçam a sua cidadania e autonomia, que sejam compassivos e próximos, que coloquem os seus saberes ao serviço das pessoas e das comunidades, preocupados com a equidade no acesso aos cuidados, com os mais vulneráveis, com a justiça e o bem comum. Enfermeiros que defendam o seu direito à formação e ao exercício das suas competências como forma de melhor serem alcançados a sustentabilidade dos serviços de saúde, a melhor saúde das pessoas e comunidades de quem cuidam e a sua satisfação profissional. Creio que a ESS/IPS tem procurado que os seus estudantes pugnem pela participação, pela reflexão e olhar crítico, pela qualidade do seu trabalho e pela capacidade de intervenção nas instituições. Acreditamos que os nossos estudantes fazem a diferença.
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